Se me ocurre
que vagas detrás de los perros
porque te sientes uno más,
y que zarandeas los árboles
cuando el viento ya es potente
porque te gusta lo insalvable
y la presencia de Dios.
Se me ocurre
que las damas duermen sin ropas
porque esperan la humedad
y que saben, aunque esperan,
que la humedad sólo saldrá de los ojos.
Se me ocurre
que las niñas vienen por el monte
porque anoche aulló el lobo.
No es cualquier cosa
marchar al frente en la fila primera
ni descubrir que sobre el horizonte
alguien ha plantado un fusil
y nos ha quitado el sol.
Desde el subsuelo lloroso
llegan los lamentos cruzados
de los que perdieron la última batalla
y de los que elevan las uñas rascando la tierra
para mostrarnos que ya no llueve
y polvo es lo único que queda.
Desde el fuego de una mirada
hasta lo gélido del futuro,
no es cualquier cosa
vivir un día y otro día y otro.
Sin héroes ya
ni leyendas a las que echar mano cuando no hay luna.
***
pilar adón
*
Penso
que vagueias atrás dos cães
porque te sentes um mais,
e que abanas as árvores
quando o vento sopra forte
porque gostas do intransponível
e da presença de Deus.
Penso
que as damas dormem sem roupas
porque esperam a humidade
e que sabem, ainda que esperem,
que a humidade só sairá pelos olhos.
Penso
que as meninas vêm pelo monte
porque à noite uivou o lobo.
Não é qualquer coisa
marchar à frente na primeira fila
nem descobrir que sobre o horizonte
alguém plantou uma espingarda
e nos tirou o sol.
Do subsolo choroso
chegam os lamentos cruzados
dos que perderam a última batalha
e dos que mostram as unhas rasgando a terra
para nos mostrarem que já não chove
e pó é só o que resta.
Do fogo de um olhar
até ao gelo do futuro,
não é qualquer coisa
viver um dia e outro dia e outro.
Sem heróis
nem legendas a que deitar a mão quando não há lua.
*
[trad: cas]
Estas piernas húmedas no me pertenecen.
Caminan junto a mí, pero no son las mías.
Mi corazón sabio me sugiere que no me asuste, porque no son mías.
Mis piernas han desaparecido,
suplantadas por trozos de carne húmeda que no reconozco, que olvido.
El azul de los brazos,
la devoción de los labios,
el giro de la cabeza hacia el firmamento. Universo negro.
Creador de paraísos ajenos, ¿en qué dirección buscarte?
Virajes, latitudes, orientación en brújula.
Vergel de verdes pájaros y sonidos mansos,
explícame en qué cumbre. Explícame cómo. Y dime, ¿por qué esa altura?
Semejante altura para seres tan diminutos.
No puedo interrumpir ahora la huida. Iniciada está y seguiré.
Las piernas no mías me orientan.
Observador de mi escasez, háblame.
¿Cómo sabré que puedo detenerme?
***
pilar adón
madrid, 1971
*
Essas pernas húmidas não são minhas.
Caminham comigo, mas não são minhas.
Meu coração sábio sugere-me sábio que não entre em pânico, porque não são minhas.
Minhas pernas desapareceram,
substituídas por pedaços de carne húmida que não reconheço que esqueço.
O azul dos braços,
a devoção dos lábios,
virando a cabeça para o céu. Universo negro.
Criador de paraísos alheios, em que direção procurar-te?
Viragens, latitudes, orientação da bússola.
Jardim de pássaros verdes e calmos sons,
explica-me em que cume. Explica-me como. E diz-me porquê essa altura?
Tal altura para seres tão diminutas.
Eu não posso parar agora a fuga. Iniciada está e seguirei.
As pernas, que não são minhas, me orientam.
Observador da minha escassez, fala comigo.
Como é que eu sei que posso parar?
***
[trad: cas]
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