Vinda de um fumundo espesso e incompreensível
a lua pulsa como um coração negro pintado
A cada pulsação avança no écran da noite
até chegar a sobrevoar a esplendente superfície do mar
que assim finalmente entra em palco
Um milhão de fogos cintilantes e frios iluminam
essa cena- uma massiva queda de estrelas
que a mesma lua projecta
sobre a memória das grandes ondas oceânicas
Há depois um daqueles instantes
em que uma veloz cadeia de coincidências antecipa
para ti a leve e inconsequente saudação da morte:
A lua transforma as vagas nuvens que por baixo dela navegam
nos cumes nevados de grandes montanhas pálidas -
pedra branca e cinza - Uma neve
que irradiasse uma neblina azulada
Como se a lua, ecoando a terra
nos céus imitasse uma paisagem terrestre
***
manuel gusmão
évora, 1945
*
É isto: a noite de manhã
Tu levantas-te
Manhã e noite não se vêm ao espelho
antes o estilhaçam para dentro
desecontram-se interminavelmente
mas ouvem-se uma à outra entre as salas da casa
Tu estás súbita ali na esquina do corredor
sinto por momentos a tua cara negra
e a imensidão do teu corpo anoitecido
passas-me a manhã devagar
de mão em mão
como um mapa fosforecente
onde por certo íamos morrer
***
Manuel Gusmão (1945)
Évora (Portugal)
adelia prado(5)
adilia lopes(8)
al berto(6)
alba mendez(4)
anxos romeo(4)
augusto gil(4)
aurelino costa(11)
baldo ramos(6)
carlos vinagre(13)
daniel maia - pinto rodrigues(4)
fatima vale(10)
gastão cruz(5)
jaime rocha(5)
joana espain(10)
jose afonso(5)
jose regio(4)
maite dono(5)
manolo pipas(6)
maria lado(6)
mia couto(8)
miguel torga(4)
nuno judice(8)
olga novo(17)
pedro mexia(5)
pedro tamen(4)
sophia mello breyner andressen(7)
sylvia beirute(11)
tiago araujo(5)
yolanda castaño(10)
leitores amigos
leituras minhas
leituras interrompidas