O que temos?
nós que, não sobrevivemos,
mas vivemos do dilúvio.
no espelho verde-irônico, contra o sol vermelho,
a arca descomunal e seu capitão:
cabra-velha parida não sei onde
cara de anjo pinto de marmanjo
a mula que cagava dinheiro
na mão direita uma pomba,
na mão esquerda um corvo e a letra B
e os 7 pares de bactérias homicidas.
deus, alá, satã ou jeová
quem criou a desmesura deste leviatã?
***
daniel faria
*
Estranho é o sono que não te devolve.
Como é estrangeiro o sossego
De quem não espera recado.
Essa sombra como é a alma
De quem já só por dentro se ilumina
E surpreende
E por fora é
Apenas peso de ser tarde. Como é
Amargo não poder guardar-te
Em chão mais próximo do coração.
***
daniel faria
*
É por isso que adormeço numa luz em movimento
E escolho um espaço para ver o espaço de frente
A sua cor de silêncio nocturno e desenho
Uma maneira quieta de estar tranquilo
Há nesse espaço uma fonte, um animal que desperta
Uma criança que navega com as próprias mãos.
Bebo com as mãos juntas.
Há uma voz que bebo. Há um espaço entre as mãos mas não perco
A sede. A água multiplica-se porque a tiro do coração
Que escuta.
Há um espaço no corpo que pode ser um lugar.
À sombra posso olhá-lo até o ver
Posso tocar as chagas no corpo
E posso beber dele morrendo
Nele como quem entra de tanto
O desejar.
***
Daniel Faria (1971-1999)
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