Eu ontem vi-te...
Andava a luz
do teu olhar,
que me seduz,
a divagar
em torno de mim.
E então pedi-te,
não que me olhasses,
mas que afastasses,
um poucochinho,
do meu caminho,
um tal fulgor.
De medo, amor,
que me cegasse,
me deslumbrasse
fulgor assim.
***
ângelo de lima
porto, 1872 - lisboa, 1921)
*
Eu era un nómade dacabalo
dun reno e a taiga era a fraga
inabarcábel da nosa tribo agonizante
a fraga das carballas centenarias
era este bosque fechado de coníferas
e o xeo que aboia na codia negra
do amur viñan sendo os restos de ramaxe
que o ulla ofrece cando a enchente
reborda nas brañas de Laíño
era unha nómade eu unha indíxena
nanai aínda non ameazada unha rena
altiva e resistente a ser domesticada
unha rena apareándose urrando
no bosque que estrema co río do dragón negro
parindo ergueita quecendo coa placenta
a chaira siberiana
***
elvira riveiro
*
quando é meia noite no meu corpo,
coincide a pele com o tamanho do
desejo- ao apagarem-se as janelas
do outro lado da rua, acende-se uma
pequenina luz no caroço das frutas.
as cidades são de pedra, é bem certo
que há sempre um jardim voltado para
a loucura, onde as tuas mãos flutuam,
ou um caminho de terra batida ao mar.
eu não sei explicar as cidades de lume,
a espessa camada de fumo que envolve a
imaginação, ou a espuma cada vez mais
branca do meu sexo. eu não sei do lugar
onde recomeçam as horas, e o tempo mata
carinhosamente. eu não sei onde estás, ou
se me ouves, quando sozinha enlouqueço.
quero-te à meia noite no meu corpo. vens?
***
alice macedo campos
*
"Nos encontraremos en un lugar en el que no hay oscuridad"
George Orwell
He imaginado siempre el día de mi muerte.
Incluso en la niñez, cuando no existe.
Soñaba un fin heroico de planetas en línea.
Cambiar por Rick mi puesto, quedarme en Casablanca
sumergirme en un lago junto a mi amante enfermo
caer como miliciana en una guerra
cuyo idioma no hablo.
Siempre quise una muerte a la altura de la vida.
Dos mil cincuenta y nueve.
Las flores nacen con la mitad de pétalos
ejércitos de zombis ocupan las aceras.
Los viejos somos muchos
somos tantos
que nuestro peso arquea la palabra futuro.
Cuentan que olemos mal, que somos egoístas
que abrazamos
con la presión exacta de un grillete.
Estoy sola en el cuarto.
Tengo ojos sepultados y movimientos lentos
como una tarde fría de domingo.
Dientes muy blancos adornan a estos hombres.
No sonríen ni amenazan: son estatuas.
Aprisionan mis húmeros quebradizos de anciana.
No va a doler, tranquila.
Igual que un animal acorralado
muerdo el aire, me opongo, forcejeo,
grito mil veces el nombre de mi madre.
Mi resistencia choca contra un silencio higiénico.
Hay excesiva luz y una jeringa llena.
Tenéis suerte, -mi extenuación aúlla-,
si estuviera mi madre
jamás permitiría que me hicierais esto.
***
raquel lanseros
*
2059
"Nos encontraremos num lugar em que não há escuridão"
George Orwell
Sempre imaginei o dia da minha morte
Inclusive na infância quando não existe
Sonhava um fio heróico de planetas em linha
Trocar por Rick o meu posto, ficar em Casablanca
Submergir num lago com o meu amante enfermo
Tombar como uma miliciana na guerra
Cujo idioma não falo
Sempre quis uma morte à altura da vida
Dois mil e cinquenta e nove
As flores nascem com metade das pétalas
Exércitos de zombies ocupam os passeios
Somos muitos os velhos
Somos tantos
Que o nosso peso arqueia a palavra futuro
Dizem que cheiramos mal, que somos egoístas
Que abraçamos com a pressão exacta de uma grilheta
Estou sozinha no quarto
Tenho olhos sepultados e movimentos lentos
Como uma tarde fria de domingo
Dentes muito brancos enfeitam estes homens
Não sorriem nem ameaçam: são estátuas
Aprisionam meus úmeros quebradiços de anciã
Não vai doer, tranquila
Tal como um animal encurralado,
Mordo o ar, oponho-me, forcejo
Grito mil vezes o nome da minha mãe
Minha resistência choca contra um silêncio higiénico
Há excessiva luz e uma seringa cheia
Tendes sorte – minha extenuação uiva
Se fosse viva minha mãe
Jamais permitiria que me fizésseis isto
*
[trad: cas]
Nos estreitos breves
a arte íngreme
de ser,
frente às faces do mundo.
A margens se re-
dobram nas entranhas das luas.
As barcas sonham a distância das flautas.
Fendido ao tempo feito
um canal,
nos orifícios cegos do fôlego,
basta
aquilo que arrefece.
A inocência do mar submerge as cítaras.
***
felipe stefani
*
Das manhãs laminares
que deslizam pelo útero
escolho aquela
vermelha suspensa
em que olhos se espalharam
grandes e convictos
e nunca mais te viram.
***
joana espain
*
adelia prado(5)
adilia lopes(8)
al berto(6)
alba mendez(4)
anxos romeo(4)
augusto gil(4)
aurelino costa(11)
baldo ramos(6)
carlos vinagre(13)
daniel maia - pinto rodrigues(4)
fatima vale(10)
gastão cruz(5)
jaime rocha(5)
joana espain(10)
jose afonso(5)
jose regio(4)
maite dono(5)
manolo pipas(6)
maria lado(6)
mia couto(8)
miguel torga(4)
nuno judice(8)
olga novo(17)
pedro mexia(5)
pedro tamen(4)
sophia mello breyner andressen(7)
sylvia beirute(11)
tiago araujo(5)
yolanda castaño(10)
leitores amigos
leituras minhas
leituras interrompidas