Aquí a cinco mil setecentos
sesenta e un quilómetros
da chuvia,
camiñar sobre o Iset xeado
pode ser un xeito inxenuo
de tripar a dureza que apurra
esta distancia desapiadada
Prospekt Lenina poder ser
máis cincenta que o Vigo
máis inhóspito e a metalurxia
cinguirse ao pé dos Urais
co mesmo sixilo que antano
as tribos de ugores
Aquí poden construírse saudades
dun lugar nomeado Casa Ipatiev un lugar
onde sobre o sangue corrompido
se erga un templo
de cúpulas douradas
Velaquí a porta da taiga
e do desterro.
***
elvira riveiro tobío
*
Qual a diferença
Entre cor de velho e cor de adolescente?
Escreveu-me a divindade certo dia
E eu, que nem fósforos colecionava,
Mas tinha ainda a tonalidade juvenil,
Recortei a divina rubrica
Destruindo assim o seu valor e o da missiva.
Era uma carta a Mário Cesariny.
Ali nos banhávamos, em letras de luz narcísica;
O ego resplandecente e muito maior que rã
De fábula.
Os girassóis debruçados das orelhas de Van Gogh
Estremeciam como lustres incendiados.
E agora vamos cor-de-burro-quando-foge
Cor-de-noite-quando-chega
Mal acompanhada,
Vamos indo cada vez mais para norte
Para as pradarias de neve
Pintar a merda da morte.
***
maria estela guedes
*
Miles de pensamentos
E amenceres densos
Fan enlouquecer a miña mente.
E a mergullan na divagación terreal,
Dunha mirada que clama
Polos teus bicos,
Somos presa e depredador,
Misturados e confundidos
Como tigres que roxen cada vez...
Máis feros,
E así...
Os días, os instintos e a carne,
dominan os nosos sentidos.
***
rosa martínez vilas
*
(pintura: "Medeia e Jasão" de Bebeth)
Ela conheceu um ser de segurança
vindo do céu
que lhe prometeu o sol
e pronto a fez rainha numa gaiola
dourada de feixes
para viver sem tempestades, sempre em acalma,
mas sucedeu que chegou com sucesso
afinal num dia nublado
e ela voou livre com o vento que não conhece gaiolas.
***
alfonso láuzara
*
Com o seu Quê, na franja de belém sobre o tejo, no despenhadeiro murado que ampara conhecidas esplanadas, o retoque de uma mão assolando o buraco frio e castanho, diminui e revitaliza os jerónimos.
na frontaria, no encaixe de suas traseiras, na compunção de uma arquitectura organicamente lida, as fezes barrocas apontam à trívia cidadela de onde a metáfora se escapa. Dali, das peneiras, se ausculta o centro comercial a ser virtuosamente adjudicado para forragens, jorrando notas à rebatina na composição do pavimento áccio-turístico.
Quando se acende a ala-lâmpada, desafeita às conquistas, o morro almadeno vitupera as crenças infantis com que se ouve, em mistura, a chuva nos telhados romanescos.
Imagino, preciso, um telhado, o céu não me conforta. Creio que a admiração resulta da visão medo-espantada. O terror firmamental, marítimo, gasoso, térreo, fez nascer a Beleza. Muitos se pulsionaram para acrescentar tal terror, para alargar o conceito de Belo. Viciados nesse medo arquétipo, combateram-no com monumentos cheios de Beleza. São cercos a Lisboa. É difícil apalpar esses módulos. Falámos nos séculos dessa beleza inagarrável. A estética é uma arma de guerra, um supremo.
Descendo a Graça, o roncar vintista do 28, na cidadania do vento, escolho os calmares, moluscos temperados no guisado das desproporções. Indiferentes e o inexoráveis, as águas?
Ao investigá-las, a apoteose dos hidrocarbonetos e de toda a semântica do lixo, fazem-me inalar as bolsas dos atravessantes, dos que nadam, dos que transitam em nada, cobrados, sadicamente cobrados.
A ponta, na sofreguidão messiânica do futuro, salta em mola sobre a insónia: os valetes continuam as suas tarefas de manter a higiene da pupila anal.
Um rio, em mar terroso vai avançando, deslocalizando a obra. No andar soterrado da travessa de s. vicente, entre a falente feira da ladra, os únicos esguichos sonoros pertencem às felinas morganas que antecipam intuitivamente os naufrágios.
Não vou comer os pastéis, nem pisar as ervas jardineiras do império. Mais a sul, no exacto mediterrâneo dos desejos informatados, um emigrante-peixe sucumbe ao peso dos seus cuidados, não pode ninguém da proceridade precaver-se.
E o zumbido da europa a farfalhar-se de leis guilhotinantes ouve-se em qualquer centro. Num bar calafetado, exaurindo com dificuldade o dia não-acontecido, os trovadores da ordem encontram energias para a justificação do balofo e, mais danoso, do taipal que cobre os horizontes. As obras - castanhas e frias - continuam a fazer-se às escondidas.
O Tejo deixa? Levanta-se um acetinado aeroporto que servirá as multidões que se dedicam à escravatura do tráfego, do tráfico. Mobilidade Mobilidade. Os amores são fixações e não trazem salários que paguem o aluguer da cabana.
Desde há cem, pessanha, eu já nem a luz vejo.
***
alberto augusto miranda
*
Hame dar igual
o lirismo inconcluso que te arrodea
Neste momento
non son mais ca
unha coleccionista de cicatrices
As verbas tropezan coas friestas pechadas
consúmense nun crematório
e todo acaba
como nun incêndio
Nestre intre
xa non procuro mais ca
recoñecerme nos vocábulos
que se albergan no interior dos meus lábios
Absorbo o silencio das palabras
e instálome muda na friúra
na xeada do mês da candeloria
Has de saber
que me restablezo tras os apósitos
ainda que de vagar
Sei que haberá outros invernos
e outonos
Nos que fixar o eterno fonema da nostalxia
dun poema
***
cruz martinez
*
eu não acredito na bondade dos anjos
todos parecem bebês de rosemary
o colorido dos vitrais não ameniza
a melancolia assustadora estampada em seus semblantes
no centro da casa
sagrada
o homem abre o livro
sagrado
e recita para si palavras pesadas
como o som de mil crucifixos arremessados ao chão
e eu penso nos pecados mais bizarros
que rondam o confessionário de vozes alteradas
depois aliviadas,
por depositarem nos ombros do representante do pai
a culpa dos seus atos impensados ou dolorosamente calculados
penso nos joelhos esfolados
por baixo das calças poídas dos fiéis fervorosos
que não sentem o gosto de ferro na boca
nem o gosto do sangue no cálice
e os sinos badalam doze vezes pausadas
ensurdecendo meus sonhos sacros
fazendo-me abrir todas as noites os olhos
quando deveriam estar fechados.
***
camila vardarac
*
(homenaxe a Inês de Castro)
e de repente, créote
Por detrás desta pantalla de linguaxe simples, parpadexas
plano inclinado á esquerda, rotación
E tan fermosa que eres, Inês, con qué grandes ollos binarios me miras
Que busto perfecto. Unha brisa deliciosa lambe os teus cabelos coma unha madame [experta en compracerte
ángulo contrapicado, 45 graos dende a dereita
As olleiras familirízante coa Morte. Fanche esvelta, desgraciada, interrogante. Inútil
O teu colo é matéria de tronos. Un pulso lánguido sobe rubor ao teu rostro de liño
Enfermaches de beleza. Quen te acoitelou sentiu s medidas perfectas que mataba
degradado de colores: cian, malva, rosado...
Non te moves. Reinas no submundo e iso
abonda.
Aenas es unha cabeza.Baixo os ollos e o teu corpo de grisalla
non ocupa máis que as miñas mans delineando coordenadas
nariz a ollo, 33. Nariz a boca, 15.
Luz cenital. Cinza e nácar, sorrís. Carbono 14 para os teus dentes. A pel cae feita encaixe. [ Es morbosa, sideral
augusta
viva
Hei reprimir as ganas de morder a túa boca que se curva tan paseniño
e seda
para falarme...
Mátame
***
estibaliz espinosa
*
Mon semblable, mon frère
Baudelaire
He sido un árbol que crece hacia el origen.
El viejo roble erguido sobre su propria sanfre.
Porque es sólo de ida el recorrido,
la soledade me viene siguiendo desde lejos.
Entonces tú la arrancas con los dientes.
Tu asombro persistente me rescata,
tu latido uniforme de certeza.
Miro la playa inmóvil de mi nativa Ítaca
los viñedos benéficos salpicando la tierra
miro mi casa azul en la colina
gota de agua salada sobre el polvo.
Está muda, ya todos se han marchado
los años han barrido el rastro de mi espada.
Menos tú, dulce Argos,
hermano, semejante,
pequeño compañero.
Menos tú que me esperas solo, para morir
igual que un semidiós que sabe que envejece.
Somos el ismo aliento en cuerpos simultáneos.
Los campos de mi alma yacen bajo tu pelo.
Ladras mi mismo idioma.
Hasta mi hambre compartes porque te pertenece.
No me pidas que olvide tus dos ojos de lago.
Dime una última vez que existe la pureza.
***
raquel lanseros
*
o dia em que milú inventou tintim
Meu semelhante, meu irmão
Baudelaire
Fui uma árvore que cresce para a origem.
O velho carvalho erguido sobre o próprio sangue.
Porque é só de ida o percurso,
a solidão vem-me seguindo de longe
Então tu a arrancas com os dentes.
Teu assombro persistente me resgata,
teu latido uniforme de certeza.
Olho a praia imóvel da minha nativa Ítaca
os vinhedos benéficos salpicando a terra
olho minha casa azul na colina
gota de água salgada sobre o pó.
Está muda, já todos se foram embora
os anos varreram o rasto da minha espada.
Menos tu, doce Argos,
irmão, semelhante,
pequeno companheiro.
Menos tu que me esperas só, para morrer
tal como um semideus que sabe que envelhece.
Somos o mesmo alento em corpos simultâneos.
Os campos de minha alma jazem sob o teu cabelo.
Ladras meu próprio idioma.
Até minha fome partilhas porque te pertence.
Não me peças que esqueça teus dois olhos de lago.
Diz-me uma última vez que existe a pureza.
*
[trad: cas]
odio virarme sobre o meu corpo
sempre coido perder a verticalidade
cando descanso en horizontal
síntome caer até afundirme nas sabas
odio verme reflectido nos espellos
cando teño a obriga de sorrir
prefiro ofrecerme unha vez tan só
e logo evadirme
moi lonxe
para ser incapaz de escoitar o eco da túa
voz na miña cabeza
***
alberte momán
*
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