Com quanto de morango eu me encharco nos seios
assim retomo a actividade ensopado em chicletes
atomatadas de a mais
remo aos miradouros dos sinos numa esquadra de chips
assombro-me por dilúvios parassimpáticos
e remenstruo as rugas fleutóxicas
do disparatado desassossego
das ruas
escurece o coração
e
bombeadas de tromboses tectónicas
e de abismos
perdem-se nos círculos da cidade
as especulações narcóticas do dilatado
complexo temporal das focas
***
carlos pinto vinagre
(espinho, 1988)
*******************
A estranxeira inventa a utopía, os finísimos dedos de Astarté
ou de como o meu sexo me obrigou a escribir contra o meu proprio sexo
dese deber
falo no poema
e en tanto pido teta pola deusa que morreu
como un meniño cadavérico e doente.
A estranxeiro coloca unha máscara e féreme a man
doe apenas pero a carne xamais cicratiza. Permanece marcando.
Escribe por min.
Por iso o meu poema é só un acto de vinganza. Ningunha <<árvore esquelética>> foi plantada nel
nin nel o pubis de miña Señor recende a crepúsculos de antano e primaveras frolescentes. Crédeme:
só a carraxe motiva a miña escrita. Como à estranxeira a carauta.
Así o meu odio visceral de neno mordido. O meu verso
violento.
Sabede que falo coa certeza de ter sido atado de pernas e brazos.
Ocorreu aquí (no poema); alguén me castrou
agora suxéitame a columna unha vara de medir a terra do inimigo, algo tribal
por suposto ferinte
e salvaxe
o terror de París
parello ao da língua que resiste á diferenza. O do texto
caníbal.
Sabede que algún dá escribirei sobre como os resentidos fomos castrados
em que lugar sucedeu
e canto tempo lles bastou a aqueles que tiveron a ben antecederme
para romperme a boca
***
gonzalo hermo
(a coruña, 1987)
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Vamos todos aprender no ensinar a não fazer
Vamos ser a não fazer nada do que sabemos fazer
É assim que interessamos
É assim paciência
Sim, vamos simplesmente imitar os que não fazem
E fazer que fazemos
A deixar que a morte se antecipe nessa ordeira e fatal vida
Deixemos pois que se faça vivas a essa vida morta logo à nascença
Bebe um só trago dessa água que sabes que te irá contaminar
E verás como te sentirás da tua embriaguez
Toma mais
E deixa-te com todos os remédios que te aconselham a estar nesta vida
Deixa-te levar por aí por toda essa subtracção que te colhe os sentidos
E ensaia-te experimentando todos os dias a remar nesse contrário
E ao longo de um pouco do muito do teu tempo
Verás como te sentes
Que cansativa e rasteira vida
Doem-te as costas e sentes o quanto se está parado
E os outros, os que fazem que fazem que estão fazendo
E simplesmente fazem porque fazem
Ou porque têm de fazer porque é assim e paciência
No porque há ainda muito para contaminar no depois curar a lucrar
Ah, esses também estão bem mal
Sim, esses que se afogam de contentes
Os do ora-sim-ora-não ou os tais de vencidos ou vencedores dessas lides
São estas resumidas e iguais vidas todas mal paradas
Neste pouco sentido do muito que não se pode fazer porque é assim paciência
Valham-nos pois, os deuses que se alegram desta podridão de tão grande pobreza
E calhar-nos-á talvez um dia um canteiro
Deitado à beira daquela estrada
Circundado por quatro caiados muros e um portão de que entrada
E que por sinal jamais te pisarás
***
alice valente alves
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Aonde antes podia chegar, a noite
formava um recado sujo e a certeza
de um mundo repetível, um espelho
quebrado - tantas as lâminas
como as memórias.
Aonde antes podia chegar, a noite
transportava um remetente aguardado,
nocturno, guiava-me pela memória
de desabitados lampiões.
Aonde depois cheguei, a noite
reescreveu à pressa o coração.
E riscou a morada,
para não ter outro regresso.
***
rui miguel ribeiro
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Cutucando a musa pelos campos de limão
Ferro comum onírico riscando o corpo farto
De sal ferido que é a palavra
Semeadura de sombras: portal de peregrino: enfarte e miocárdio
Cutucando a musa pertinaz e negativo
Aprendo a cair pedaço a pedaço
Como quem da vida desce ainda
- Luiza, a uma hora destas?!
Sem curar de todo, sem descrendo
Que a luz retida nos teus olhos é -
Mas não é no fim que tudo acaba.
***
jorge fazenda lourenço
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desço por um jardim transparente
entre lodo e hortelã
andam assistentes sociais pelo bosque
à procura de pobres
agitam contam e berlindes
acaba aqui a rédea solta, há que escolher as armas
troco à sombra do derradeiro cipreste
dois versos e um dedo
por uma noite de sono e um detonador
***
joão almeida
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do corpo exposto agardando o cataclismo
do catecismo tóxico das horas
das amoras da necrose
amor
da podremia das amoras
ou da inclemencia calendaria
só deglutir a casca co compango
dun viño morno de chuvia polos peitos
do prebe nutricio da carne transparente
do vexetal bocado do desexo
mesmo pairando sobre o gozo
un futuro preñado de osamentas
***
elvira riveiro
(cunchido - pontevedra, 1971)
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Não sei se foi a tonalidade azul do meu corpo
tingido pelo teu olhar
ou os segredos de lâmina
que te queimavam as feições vítreas.
A verdade é que todos os gestos se calaram à tua passagem
mas, ainda assim, eu sabia da existência de um timbre negro
que fervilhava à mesma altura dos sonhos.
A partir daqui nenhuma lágrima teve o feitio de antes
e só consigo escrever letras vivas,
as que isolam o passado da vida.
Comparo a escrita a uma caneca de vinho
que destila as memórias
até que estas tenham a dimensão de um silêncio estreito.
Deixei um recado aceso no teu sono
porque a música acabou antes da noite
e nunca mais falaremos um do outro.
Fecho-me em casa a praticar uma arte arte marcial desconhecida.
Sei que o mundo desliza delicadamente para os jornais
e isso basta-me.
Pega num pedaço destes versos e coloca-o junto aos ouvidos:
é por baixo desta paixão áspera
que te dedico o meu terror.
As pálpebras gritam o peso de um oceano.
O mundo fuma a minha morte.
***
sara costa
(cucujães, 1987)
*******************
Os dois bebemos a noite toda, sem parar,
entre conversas, onde nada se dizia
e tudo se calava em gritaria
sem medo de cantar.
Oh, a minha primeira noite sem dormir!
E vi nascer o dia, à chuva, deslumbrado,
cambaleando em passo lento, enlameado,
com medo de cair.
Contigo contemplei, em tom profundo,
a cor da lucidez do vonho vivo,
vagabundagem com som próprio e sentido,
até ao fim do mundo!
***
antonio barahona
********************
Uma espécie.
Mastigar os passos ardentes
Aí se fecham os sítios
a que vou pertencer.
encontrar uma presença
talvez de deuses,
o que ardia em convulsão
quando o claustro abriu latejei.
Como é redimível
a confissão.
Lembrar-te-ás ainda que existo
de cama
nesta casa fechada
Não tem nome este corpo de ideia.
O efémero ganha apoteose de destino
heresia viva
à última vela, a tua mão prendeu-me o braço
quando todos os meus nervos estavam a rogar
escorrego,
na casa de espelhos da poesia,
rasgas a camisa, tornas.
Esmago a tâmara,
recordo sempre.
***
luísa mota
(lisboa, 1972)
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