Cando falla a filosofía
Busco os anacos torados,
Os cristais de cores
Nas cavernas soñados
E gardados para amalos,
E na gruta do esquecido
Cavilo sobre a molécula
Que ensancha e varía en algo
Sen nome.
Cando falla a filosofía
E penso tanto no senso
Da finalidade do universo
Das pingas de ciencia
Que crean a esperanza
E que esvaece en nada
Volta a envolverme
E a darme o todo
Ou algo, sen nome
Cando falla a filosofía
Decátome que o que falla
É a perspectiva.
***
Rosa Martínez Vilas - 1974
Armenteira - Galiza
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Chove, é un día marrón
percíbese unha estraña melancolía
no ar
A mañá semella unha sinfonía ínacabada
balada de outono
interpretada na quietude dul solpor
aparente
Pingas frías baten nas fiestras e xacen nos vidros
nunha perfecta interpretación dramática
O silencio acada temidas sombras
tépedas
e trespasa extensións grises coma nave illada
no inmenso océano
Os ocos das feridas atravesan longas avenidas
dunha cidade que se move ás présas
Os ollos formulan preguntas escuras
as repostas son estatuas mudas
nas prazas dunha evidente noite pecha
Pombas inmersas no seu holocausto
son asainadas por un decreto, seica
necesario
Chove, é un día marrón
Se soubese, faría cos elementos precisos
un blues, adecuado aos gatos que moran
nas inmediacións do inferno
***
Cruz Martínez Vilas - 1960
Armenteira - Galiza
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{o imprevisível é remisturável.
as horas contradizem os minutos.
chorar muito sobre um rio seco,
esperar o espírito dos peixes.
acordar poeticamente um dia
porque a memória se esqueceu
que o esquecimento seria lançado
numa poesia completa e definitiva.
e escrever mais um poema que
esconde tristezas junto de falhas.
e actualiza desactualizando.
inventada escrevo de novo.
escrever é esculpir sem pedra.
e depois procurar uma pedra,
pesar a pedra, e depois o poema.
e ainda pesá-los juntos e verificar
se o peso bate, contradiz ou a pedra voa.
pesar com os olhos e a leitura.
porque o imprevisível é saturável.
remisturável. talvez acorde um dia
adormecida em muito amor,
talvez não seja realmente eu
mas um prazer minúsculo que me derroga,
talvez me resgatem apenas de uma lágrima.
***
Sylvia Beirute - 1984
Faro
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O mundo talvez esteja fora do mundo, aí nos encontramos.
Dispomos os pertences, esperamos tranquilidade,
a nossa viuvez que se esconde no seu negrume.
A casa está no entanto assombrada,
como se isso importasse. O fantasma sou apenas
eu quem o vejo e ouço, menos medo que altercações,
como o soalho que estala nas noites ou as vagas assustadiças.
Com o tempo o intruso, que é também o dono antigo,
é apenas mais como nós, mais um fantasma apaixonado.
Um fantasma com piedade, que não nos expulsa
mas que vai ditando, com todas as letras, a sua narrativa,
feita nossa, e que talvez, como um espectro, nos salve.
***
Pedro Mexia - 1972
Lisboa
*****************************+
Não perguntei ao agonizante que paisagem
via para além dos pés da cama
que era aquilo dos rostos inquietos
se de verdade inquietos
aos pés da cama há tantos dia ai
há tantos tantos dias
espreitando espreitando de olhos molhadinhos
a passa passividade a quase bem passada
posição deitada mas respirante ainda
Não perguntei se do outro lado
por cima ou bem melhor atrás
da vazia cabeça alguma coisa ardia
sem nada anunciar
tudo pronunciando
***
Pedro Tamen - 1934
Lisboa
******************************
Não
te ofereço
a rosa
mas
o nome
da
rosa
que
serviria
meu amor
oferecer-te
a rosa
se dura
a rosa
pouco mais
que o tempo
em que te
digo rosa?
Não te
ofereço
a rosa
mas
o nome
meu amor
do amor
da rosa
eco
do que te digo
repetido
e mais rosa
te ofereço
se é
rosa
o que redigo
(rosa por cem vezes repetido)
do que
te dar
a rosa
que
não
dizendo
então
de amor
desdigo
***
Rita Taborda Duarte - 1973
Lisboa
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Eles conheceram-se neste abraço
em que levam tanto tempo,
embalados na cadência
de uma canção desconhecida
e no mover das mãos que hesitam
entre o animal e a planta.
O tempo privou-os de vida
mas não um do outro, tangíveis
nos membros onde o desejo
lateja ainda,
gestos como medusas esvaindo-se
no sangue em que se fundiram para sempre.
Geraram esta outra placenta
com a urgência de quem sabe
que bebe em cada trago despedida:
lenta colheita da alma
que palidamente assoma
em cada poro,
subtil, alada como pluma
que sem ser vista
se solta.
Neste abraço os reteve até à sufocação,
Depois que se abateram o céu e o horizonte,
o mundo foi-lhes langor
e memória acesa;
petrificados, mortos,
estão diante do nosso olhar,
na posição aflita em que os une,
mais que o esterno e a pelve,
o duplo receio da imortalidade.
***
Paulo Teixeira - 1962
Maputo - Moçambique
*****************************
Se eu fosse para a terra do nunca,
teria tudo o que quisesse numa cama de nada:
os sonhos que ninguém teve quando
o sol se punha de manhã;
a rapariga que cantava num canteiro
de flores vivas;
a água que sabia a vinho na boca
de todos os bêbedos.
Iria de bicicleta sem ter de pedalar,
numa estrada de nuvens.
E quando chegasse ao céu, pisarial
as estrelas caídas num chão de nebulosas.
A terra do nunca é onde nunca
chegaria se eu fosse para a terra do nunca.
E é por isso que a apanho do chão,
e a meto em sacos de terra do nunca..
Um dia, quando alguém me pedir a terra do nunca,
despejarei todos os sacos à sua porta.
E a rapariga que cantava sairá da terra
com um canteiro de flores vivas.
E os bêbedos encherão os copos
com água que sabia a vinho.
Na terra do nunca, com o sol a pôr-se
quando nasce o dia.
***
Nuno Júdice - 1949
Mexilhoeira Grande - Portimão
****************************************
A alma é como a lavra.
Quando as nossas mãos voltam a desfilar
o milho amarelo de ouro?
Que outras mãos que as nossas semeiam
o medo e o silêncio da morte?
Porquê este frio? Porquê tão longa a noite?
Como se faz o mundo? Quando começa o mundo?
***
Maria Alexandre Dáskalos - 1957
Huambo - Angola
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Sentam-se sob as acácias no asfalto roto
os mutilados com cigarros de embalar.
Nenhum som os recorta
e todos os sentidos foram amputados.
Nem para a tarde crescem frustrados.
Esperam. Que inconclusa forma
os limita em fórmula de serração?
Que ameaça os delira? Nenhuma flor
explode, poeta, no coração?
Os mutilados sonharão? Suas pernas?
O desejo, fruto podre adubando. Outra mão?
Que triste palavra os baba
no cigarra morto! Vendem.
Nenhum incesto os estanca.
À revelia do sol, os mutilados
montam banca.
***
Luís Carlos Patraquim - 1953
Maputo Moçambique
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