És tentação permanente
à minha beira
Beijos rasos
à flor das bocas
Húmidas as duas
e as duas loucas
A do corpo mais que a da face
inteira
Inteiramente tuas
de maneira
que quando a tua língua
se incendeia
pega fogo ao desejo
e logo a chama
galgando em si própria
já se ateia
Trepando devastando
e só no topo
é grito e orgasmo
e é madeira
***
Maria Teresa Horta
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Busco a poesia no âmago da vida
ou nas esquinas
ou nas curvas e
contracurvas
. Em todo o ladohá luz
ou sombras. R tudo
é poesia
.Não tenho escolas,
nem gurus.
A linha da poesia é linha
da vida.
***
João Melo
Luanda 1955
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libélulas avoam danças
aranhas cospem tranças
morcegos ralham noites
ursos linguam potes;
rapozas agalinham-se
ondas engolfinham-se;
carochinha avoa voa
preguiça dorme à toa;
toupeiras entunam-se
grilos estrelam-se;
noites adescaem
estrelas agrilam-se
eu libelulizo-me.
***
Ondjaki
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receberei deus estendidas
as paisagens, eu de
coração índigo, plantando
bocas na extremidade
de cada apetite, esperando
que a voz mate a fome
do silêncio, numa última
tentativa de acalmar as
copas, já a chuva,
já tarde
***
valter hugo mãe
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sobe as escadas até ao amor,
onde a mulher é um corpo contigo,
e a noite tem um ano de cem séculos.
pergunta-lhe pelo vento, que fez dele,
se recorda o nome dos amantes
ou o instante em que o sangue
se fez vinho amargo.
ama-a, dança-lhe os passos,
limpa-lhe o batom,
sepulta-a na cama outrora neve,
onde as sementes de fogo
já arderam. e depois sai, sai.
deixa-a carpindo maquilhagem
e confessando a noite a um cigarro,
vai-te a outras mulheres, vai,
mas não esqueças nunca
a cor das lágrimas,
o desfiar de amantes,
o perfeito som do vento
no coração arruinado da cidade.
***
João de Mancelos
Coimbra - 1968
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A colcha da cama desfeita
é agora mais leve e mais clara.
As sandálias brancas enviaram
ao armário, a sobra das botas. No lugar
do gorro de lã, demora-se hoje
um leve chapéu de palha. Algumas secaram, mas o calor dos
corpos libertou os lençóis
da sua humilde tarefa, lançando-os
longe como vagas de Agosto.
***
Inês Lourenço
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Está aqui a presença
a presença da palavra que ainda não escrevi
nítida, conforme, absoluta
está aqui e não se escreve
porque vem no silêncio irrevelada
intensa e breve
por isso deponho nela
a minha exacta medida de não ser e acordo
outra estranha expressão
pela boca ou pela mão me cresce o seu sonho
e vagarosamente o olhar nela me faz ser
dessa palavra
um princípio de mundo
ainda por acontecer
***
Ana Mafalda Leite
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Beijo os teus seios e a tarde comove-se
como se tocassem sinos
Levanto a tua cabeça entre os meu dedos e abro contra o dia os teus cabelos
e, logo, as aves do silêncio levantam vooe dançam loucas em volta dos teus olhos,
e a tua boca aperta-se,
morde
a minha boca
enquanto as minhas mãos vão procurandonenhum deus à flor da tua pele
por esse caminho branco onde agonizam éguas
vestidas de primavera.
***
Joaquim Pessoa
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Todas as vidas gastei
para morrer contigo.
E agora
esfumou-se o tempo
e perdi o teu passo
para além da curva do rio.
Rasguei as cartas.
Em vão: o papel restou intacto.
Só meus dedos murcharam, decepados.
Queimei as fotos.
Em vão: as imagens restaram incólumes
e só meus olhos
se desfizeram, redondas cinzas.
Com que roupa
vestirei minha alma
agora que já não há domingos?
Quero morrer, não consigo.
Depois de te viver
não há poente
nem o enfim de um fim.
Todas as mortes gastei
para viver contigo.
***
Mia Couto
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- Quando eu morrer batam latas,
Rompam aos berros e aos pinotes -
Façam estalar no ar chicotes,
Chamem palhaços e acrobatas.
Que o meu caixão vá sobre um burro
Ajaezado à andaluza:
A um morto nada se recusa,
E eu quero por força ir de burro...
***
Mário de Sá-Carneiro
Lisboa (1890)
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