palavras soletradas
percorrem os ouvidos do mundo
interrompem a respiração e a colocam
no outdoor da avenida
de nada adianta arfar
sem coragem
bed and breakfast na uriarte
os passantes não atravessam
a rua ela está interrompida
pelo pulso das reticências
entre o branco
e o vermelho a pele
se desfaz no sim e
no talvez
o elemento surpresa
é o pretexto
e a acção escorrega
pela via paralela
subir a ladeira
por baixo dos carros
me mata a tarde inteira
peço ao faxineiro
uma flor na janela
quantas donzelas
se renderam ao feliz
para sempre
lamnendo os dedos de mel
disseram
entre um suspiro e
algum ruído
que se sobrepôs
no outdoor
como se fincado
ali houvesse mais que
partículas de desejo.
***
Valeska de Aguirre (1973)
Brasil
Ela cabe no meu mundo como um leve toque
de asa no meu rosto
(asa
de um pássaro ver-
melho-batom. Um tom.
um céu ris-
cado em claro tom.
Música de sino de
cidade pequena pequenos di-
minutos dedos velozes
(meu corpo dentro de
um carro luz-me-
tal atravessa
a cidade
quando os
dedos
dela
deslizam.
***
Simone Brantes (1963)
Brasil
Então
ele se sentou
num banquinho
ajeitou
o chapéu de feltro
colocou o filho
mais velho
ao seu lado
e se deixou fotografar
Então
ela se sentou
no murinho
da casa
esticou o vestido
cobrindo os joelhos
sorriu
para a lente
e também
se deixou fotografar
***
Heitor Ferraz Mello (1964)
França
Sob o duplo incêndio
da luz e do néon,
sobre um parapeito de
mármore, entre duas cortinas
jogadas pela brisa marinha
que ao mesmo tempo às suas
coxas e costas dispensava
um hálito incontínuo,
inundando de rubro o restrito
perímetro de seu jarro em cerâmica
e contrastando imemorial com a
transitoriedade de tudo ali
hotel, amor, dia, noite, carros,
uma flor alheia a símbolos
atingia seu ponto máximo
de beleza.
***
Carlito Azevedo (1961)
Rio de Janeiro - Brasil
A imagem foi surgindo
lentamente
de águas profundas.
A princípio,
eu mesmo estranhei
a nova anatomia.
Aqueles
imensos olhos negros
haviam migrado de outro rosto
em que reconheci
a mandíbula do inimigo.
o predador esquivo
- meu hospedeiro do meu rosto -
desliza elástico
pelas correntes marítimas do espelho.
***
Augusto Massi (1959)
São Paulo - Brasil
Oculto entre os cobertores, falo
com o siamês; "siamês, vamos para o Novo
México, quero ver a ruína
da ferrugem ao sol, e o
deserto de dias, um
cacto". Cada um de nós
leva o roçar de suas pedras
na mão, compara
o método de seu rosto na ilha do medo. Eu
sou assim, e também
posso ser como você, fracassar
ao morder uma pêra, ou um biscoitinho
qualquer. Siamês, me leva para longe, diz em
meu ouvido aq tua posição
neste céu branco
do navio; e do falar, diz
cada repetição de
tuas palavras, aonde te
conduzem.
***
Aníbal Cristobo (1971)
Buenos Aires
dó
ré
mi
eu penso em béla bartók
eu penso em rita lee
eu penso no stradivárius
e nos vários empregos
que tive
pra chegar aqui
e agora a turbina falha
e agora a cabine se parte em duas
e agora as tralhas todas caem dos compartimentos
e eu despenco junto
lindo e pálido minha cabeleira negra
meu violino contra o peito
o sujeito ali da frente reza
eu só penso
dó
ré
mi
eu penso em stravinski
e nas barbas do klaus kinski
e no nariz do karabtchevsky
e num poema do joseph brodsky
que uma vez eu li
***
Angélica Freitas (1973)
Pelotas - Brasil
COM O BREVE ARREPIO de feltro,
revirando a bolsa. a tela
comentada. levam ao que conclui ser: esconderijo.
a única palavra que aprendeu
em coreano: pode. há sempre um
jeito de distribuí-la onde as árvores da ponte
***
Walter Gam (1983)
Belo Horizonte - Brasil
"Não acredito que te perdi"
cochichou perdendo a faixa
da música que deveria colocar
para as pessoas não escutarem
o que gritava tentando cochichar
ao ouvido da garota que se despedia
e que pensou escutar
"não acredito que te perdi"
mas não pediu para ele repetir
pois já tinha ouvido o ruído da faixa
terminando e ele afastando-se
para posicionar a agulha em qualquer
outro círculo e assim ninguém
reparar na garota que ali permanecia
na tentativa de ir embora.
***
Valeska de Aguirre (1973)
Rio de Janeiro - Brasil
Fique agora teu olhar
num pequeno, mínimo ponto
retido. Que não seja,
porém, teu umbigo, mas um
ponto abstrato, do mínimo traço
da menor de tuas miudezas despido.
Fique diante dele assim
alienado, esquecido,
enquanto ele, obscuro, vai
mais e mais sumindo
sumindo sumindo.
Agora acorda, ergue teu olho
e rapidamente contempla
a retidão destas árvores
a claridade deste céu quase escuro
onde daqui a pouco aquele ponto
vai, luminoso, aparecer.
***
Simone Brantes (1963)
Nova Friburgo (RJ) - Brasil
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