Quarta-feira, 2 de Novembro de 2011
nunca são as coisas mais simples que aparecem

 

Nunca são as coisas mais simples que aparecem
quando as esperamos. O que é mais simples,
como o amor, ou o mais evidente dos sorrisos, não se
encontra no curso previsível da vida. Porém, se
nos distraímos do calendário, ou se o acaso dos passos
nos empurrou para fora do caminho habitual,
então as coisas são outras. Nada do que se espera
transforma o que somos se não for isso:
um desvio no olhar; ou a mão que se demora
no teu ombro, forçando uma aproximação
dos lábios.

 

***

 

nuno júdice

 

*


lido em: http://www.astormentas.com/judice.htm

publicado por carlossilva às 03:42
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Domingo, 8 de Maio de 2011
fotografia

 

Naquilo a que o jornal chama um nu sulfuroso de

atget (1925) a mulher está de gatas em cima da cama,

e olha para trás, de esguelha, como se quisesse

mostrar-se ao fotógrafo, por um lado, e esconder-se

de nós, por outro. Mas quando a olhamos, adivinha-se

um sorriso que, não se sabe porquê, se esbate com

essa espécie de névoa com que o tempo envolve

as fotografias antigas, a sépia, em que não é

possível disfarçar a certeza que temos de aquela

mulher, hoje, não passa de cinza nalgum canto

de cemitério de província. Porém, a sua nudez

desafia a morte; e quase lhe podíamos pedir

que esqueça o fotógrafo, e regresse à realidade

onde ele a foi descobrir, para que a sua vida

retome o curso de habitual, e não nos perturbe com

esse sentimento de que a vida é breve, e já foi.

 

***

 

nuno júdice

 

*


lido em: resumo a poesia em 2010

publicado por carlossilva às 00:14
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Sábado, 20 de Fevereiro de 2010
a terra do nunca

 

Se eu fosse para a terra do nunca,

teria tudo o que quisesse numa cama de nada:

 

os sonhos que ninguém teve quando

o sol se punha de manhã;

 

a rapariga que cantava num canteiro

de flores vivas;

 

a água que sabia a vinho na boca

de todos os bêbedos.

 

Iria de bicicleta sem ter de pedalar,

numa estrada de nuvens.

 

E quando chegasse ao céu, pisarial

as estrelas caídas num chão de nebulosas.

 

A terra do nunca é onde nunca

chegaria se eu fosse para a terra do nunca.

 

E é por isso que a apanho do chão,

e a meto em sacos de terra do nunca..

 

Um dia, quando alguém me pedir a terra do nunca,

despejarei todos os sacos à sua porta.

 

E a rapariga que cantava sairá da terra

com um canteiro de flores vivas.

 

E os bêbedos encherão os copos

com água que sabia a vinho.

 

Na terra do nunca, com o sol a pôr-se

quando nasce o dia.

 

***

Nuno Júdice - 1949

Mexilhoeira Grande - Portimão

 

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publicado por carlossilva às 14:56
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Quarta-feira, 11 de Novembro de 2009
jogo

 

Eu, sabendo que te amo,

E como as coisas do amor são difíceis,

Preparo em silêncio a mesa

do jogo, estendo as peças

sobre o tabuleiro, disponho os lugares

necessários para que tudo

comece: as cadeiras

uma em frente da outra, embora saiba

que as mãos não se podem tocar,

e que para além das dificuldades,

hesitações, recuos

ou avanços possíveis, só os olhos

transportam, talvez, uma hipótese

de entendimento. É então que chegas,

e como se um vento do norte

entrasse por uma janela aberta,

o jogo inteiro voa pelos ares,

o frio enche-te os olhos de lágrimas,

e empurras-me para dentro, onde

o fogo consome o que resta

do nosso quebra-cabeças.

 

***

Nuno Júdice

 

******************************

 

 



publicado por carlossilva às 12:33
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Quinta-feira, 1 de Outubro de 2009
até ao fim

 

Mas é assim o poema: construído devagar,

palavra a palavra, e mesmo verso a verso,

até ao fim. O que não sei é

como acabá-lo; ou, até, se

o poema quer acabar. Então, peço-te ajuda:

puxo o teu corpo

para o meio dele, deito-o na cama

da estrofe, dispo-o de frases

e de adjectivos até te ver,

tu,

o mais nu dos pronomes. Ficamos

assim. Para trás, palavras e versos,

e tudo o que

não é preciso dizer:

eu e tu, chamando o amor

para que o poema acabe.

 

***

Nuno Júdice

 

****************************

 



publicado por carlossilva às 12:36
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Terça-feira, 4 de Agosto de 2009
cantiga

 

É pelo teu rosto em que as marés passam,

pelos teus lábios em que voam gaivotas,

pelos teus dedos em que a luz perpassa,

pelos teus olhos que me traçam as rotas,

 

que este barco encontra o caminho,

que este dia descobre que não é tarde,

que as palavras se bebem como vinho,

e o fogo não queima quanto arde.

 

É no que me dizes quando a noite fala,

no que perdura da manhã que se esquece,

no que é dito em tudo que se cala,

e não precisa de ser dito quando amanhece.

 

Pode ser o amor tantas vezes sentido,

ou só aquilo que vive no coração,

pode ser o que pensava ter esquecido,

e regressa agora pela tua mão.

 

Quantas vezes já foi primavera,

e logo aí as flores morreram:

até ao dia em que nada ficou como era,

e todas as folhas mortas reverdeceram.

 

***

Nuno Júdice


****************************


lido em: A matéria do poema

publicado por carlossilva às 01:46
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Sábado, 11 de Outubro de 2008
poema de amor para uso tópico

Quero-te, como se fosses

a presa indiferente, a mais obscura

das amantes. Quero o teu rosto

de brancos cansaços, as tuas mãos

que hesitam, cada uma das palavras

que sem querer me deste. Quero

que me lembres e esqueças como eu

te lembro e esqueço: num fundo

a preto e branco, despida como

a neve matinal se despe da noite,

fria, luminosa,

voz incerta de rosa.

 

***

Nuno júdice (1949)


lido em: Poesia Reunida

publicado por carlossilva às 13:22
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Quarta-feira, 14 de Maio de 2008
príncipios

Podíamos saber um pouco mais
da morte. Mas não seria isso que nos faria
ter vontade de morrer mais
depressa.

Podíamos saber um pouco mais
da vida. Talvez nao precisássemos de viver
tanto, quando só é preciso é saber
que temos de viver.

Podíamos saber um pouco mais
do amor. Mas não seria isso que nos faria deixar
de amar ao saber exactamente o que é o amor, ou
amar mais ainda ao descobrir que, mesmo assim, nada
sabemos do amor.

 

 

***

 

Nuno Júdice (1949)

Mexilhoeira Grande - Portugal

 



publicado por carlossilva às 00:01
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