A vida é uma ribeira;
Caí nela, infelizmente…
Hoje vou, queira ou não queira,
Aos trambolhões na corrente.
Crês que ser pobre é não ter
Pão alvo ou carne na mesa?
Mas é pior não saber
Suportar essa pobreza!
O luxo valor não tem
Nos que nascem p’ra pequenos:
Os pobres sentem-se bem
Com mais pão luxo a menos!
A esmola não cura a chaga;
Mas quem a dá não percebe
Ou ela avilta, que ela esmaga
O infeliz que a recebe.
A ninguém faltava o pão,
Se este dever se cumprisse:
- Ganharmos em relação
Com o que se produzisse.
O homem sonha acordado;
Sonhando a vida percorre…
E desse sonho dourado
Só acorda, quando morre!
Quantas, quantas infelizes
Deixam de ser virtuosas…
E depois são seus juízes
Os que as fazem criminosas!...
Sem que o discurso eu pedisse,
Ele falou; e eu escutei.
Gostei do que ele não disse;
Do que disse não gostei.
Tu, que tanto prometeste
Enquanto nada podias,
Hoje que podes – esqueceste
Tudo quanto prometias…
Chegasses onde pudesses;
Mas nunca devias rir
Nem fingir que não conheces
Quem te ajudou a subir!
Os que bons conselhos dão
Às vezes fazem-me rir,
- Por ver que eles próprios são
Incapazes de os seguir.
Mesmo que te julguem mouco
Esses que são teus iguais,
Ouve muito e fala pouco:
Nunca darás troco a mais!
Entra sempre com doçura
A mentira, pr’a agradar;
A verdade entra mais dura,
Porque não quer enganar.
Se te censuram, estás bem,
P’ra que a sorte te perdure;
Mal de ti quando ninguém
Te inveje nem te censure!
***
antónio aleixo
(Vila Real de Santo António, 1899 —1949)
**************************
É no teu olhar tão puro
Que vou lendo o meu futuro,
Pois o passado esqueci:
E fico recompensado
Da perda desse passado
Quando estou ao pé de ti,
***
António Aleixo
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Não sou esperto nem bruto,
nem bem nem mal educado:
sou simplesmente o produto
do meio em que fui criado.
Peço às altas competências
Perdão, porque mal sei ler,
P’ra aquelas deficiências
Que os meus versos possam ter.
Há luta por mil doutrinas.
Se querem que o mundo ande,
Façam das mil pequeninas
Uma só doutrina grande.
Eu não tenho vistas largas
nem grande sabedoria,
mas dão-me as horas amargas
Lições de Filosofia.
Para não fazeres ofensas
e teres dias felizes,
não digas tudo o que pensas,
mas pensa tudo o que dizes.
Entre leigos ou letrados,
fala só de vez em quando,
que nós, às vezes, calados,
dizemos mais que falando.
Quem nada tem, nada come;
e ao pé de quem tem comer,
se disser que tem fome,
comete um crime, sem querer.
P'ra a mentira ser segura
e atingir profundidade,
tem de trazer à mistura
qualquer coisa de verdade.
Que importa perder a vida
em luta contra a traição,
se a razão, mesmo vencida
não deixa de ser Razão.
Embora os meus olhos sejam
os mais pequenos do Mundo,
o que importa é que eles vejam
o que os homens são no fundo.
Porque o mundo me empurrou,
caí na lama, e então
tomei-lhe a cor, mas não sou
a lama que muitos são.
Uma mosca sem valor
poisa c’o a mesma alegria
na careca de um doutor
como em qualquer porcaria.
Co'o mundo pouco te importas
porque julgas ver direito.
Como há-de ver coisas tortas
quem só vê o seu proveito?
Quantas sedas aí vão,
quantos colarinhos,
são pedacinhos de pão
roubados aos pobrezinhos!
Vós que lá do vosso império
prometeis um mundo novo,
calai-vos, que pode o povo
q'rer um mundo novo a sério.
Porque será que nós temos
na frente, aos montes, aos molhos,
tantas coisas que não vemos
nem mesmo perto dos olhos?
Quando não tenhas à mão
Outro livro mais distinto,
Lê estes versos que são
Filhos das mágoas que sinto.
Ser artista é ser alguém!
Que bonito é ser artista...
Ver as coisas mais além
do que alcança a nossa vista!
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