Sábado, 30 de Abril de 2011
paisagem com mar

 

Vinda de um fumundo espesso e incompreensível

a lua pulsa como um coração negro pintado

A cada pulsação avança no écran da noite

até chegar a sobrevoar a esplendente superfície do mar

que assim finalmente entra em palco

 

Um milhão de fogos cintilantes e frios iluminam

essa cena- uma massiva queda de estrelas

que a mesma lua projecta

sobre a memória das grandes ondas oceânicas

 

Há depois um daqueles instantes

em que uma veloz cadeia de coincidências antecipa

para ti a leve e inconsequente saudação da morte:

A lua transforma as vagas nuvens que por baixo dela navegam

nos cumes nevados de grandes montanhas pálidas -

pedra branca e cinza - Uma neve

que irradiasse uma neblina azulada

 

Como se a lua, ecoando a terra

nos céus imitasse uma paisagem terrestre

 

***

 

manuel gusmão


 

évora, 1945

 

*


lido em: público

publicado por carlossilva às 15:47
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Sexta-feira, 29 de Abril de 2011
receita

 

Vidro, muito vidro

moído.

 

Consumido

vagarosamente.

 

A melhor dieta

para tornar o poeta

transparente.

 

***

 

cláudio lima

 

ponte de lima, 1943

 

*


lido em: resumo a poesia em 2010

publicado por carlossilva às 09:36
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Quinta-feira, 28 de Abril de 2011
orientação

 

Escrevi milhares de versos

para esquecer. Amei algumas mulheres

para lembrar. Agora já posso dizer

o som em carne viva.

 

A cidade assemelha-se a um acampamento

abandonado no deserto. Os nómadas

partiram nos seus camelos, com provisão

de tâmaras e água.

Há restos de detritos, sinais de trânsito,

folhas arrancadas a revistas pornográficas,

ao sabor do vento, por entre pétalas

sêcas de flores mortas.

 

Há resíduos de sítios onde estive contigo,

fragmentos de versos de vidro, tudo

muito nítido, anotado, vincado a oiro.

 

***

 

antónio barahona

 

*


lido em: resumo a poesia em 2010

publicado por carlossilva às 09:27
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Quarta-feira, 27 de Abril de 2011
murmuro o teu nome ao rés da relva

 

Murmuro o teu nome ao rés da relva

 

Murmuro-o

Em diagonal da terra ao céu azul

Radiante

 

Felicíssimo

Não entendo nada

 

***

alberto de lacerda

 

*


lido em: resumo a poesia em 2010

publicado por carlossilva às 08:03
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Terça-feira, 26 de Abril de 2011
50 anos

 

Talvez escreva

poemas

que já li

que outros já escreveram

que eu mesma já escrevi

esqueço-me

da minha vida

 

***

adília lopes

 

*


lido em: resumo a poesia em 2010

publicado por carlossilva às 19:01
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Domingo, 24 de Abril de 2011
anoitecer em buenos aires

 

As longas avenidas talvez imaginárias

demonstram-me a existência de lugares

que poderiam ter-me pertencido

numa idade passada; é irreal

 

agora percorê-las: tê-lo-ia

sido sempre, não poderia haver

motivo para dor num tempo qu ecom este

presente se divide; é um espectro tardio

 

o espaço finalmente criado pelo olhar:

aí estás olhando-me nos olhos

cidade sob a forma de jovem ser unívoco

 

ainda inexistente no tempo de uma vida

vivendo no espaço que não teve o seu tempo,

e tarde volta do tempo onde não esteve

 

***

gastão cruz

 

*


lido em: público

publicado por carlossilva às 17:24
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Sexta-feira, 15 de Abril de 2011
palavras de um pensamento interrompido


sei esta paisagem de cor por outras coisas: coisas-nada ou coisas-vinho
sei o tempo que escorre para lá da folha de papel e se derrete,
até aos dedos dos pés,
como um acabar lento de espaço e de melancolia.
há um apagar de horas sobre a mesa de centro,
conto os anos que faltam para avistar a solidão e caminho,
e prendo entre os fios de cabelo a recordação de um final de dia com sabor a azul.
vi em postais gastos de sépia e de esperança, este esplendor de sufoco e de vida:
um caminho estreito ladeado de ciprestes, desembocando numa casa em ruína.
soube os meus braços pendendo das janelas da casa,
>e os meus joelhos no lugar das fundações;
a minha cabeça era um telhado quebrado pelo vento
e os meus olhos ninho de um qualquer ser esvoaçante de passagem sazonal.

 

***

marlene jabouille

 

lisboa, 1987

 

*


lido em: http://poetasportuguesesdoseculo21.blogspot.com/search/label

publicado por carlossilva às 15:40
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Quinta-feira, 14 de Abril de 2011
moléculas de sonho, som de água

 

Moléculas de sonho, som de água.
No instante preciso a pedra transforma-se
e derrete o ser dos mais fortes corações
na passagem unida das arestas,
no puro sentido das palavras.
É de rocha,
tenra e firme rocha,
a senda solidária
gravada no único sentido
da corrente sensitiva.
Paz guardada no canto das aves,
na cachoeira verde
e nas palavras.
A esperança do mundo é uma mão.

 

***

 

iolanda aldrei

compostela, 1968

 

*



publicado por carlossilva às 18:47
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Quarta-feira, 13 de Abril de 2011
pezas

 

Ningunha psiquiatra,

nin psicóloga,

nin neuróloga,

ningunha delas,

pode saber o que eu teño na cabeza.

Así que, que non mo conten tan lentamente,

que xa non me importa o que diga a xente,

e o que vive no mundo que eu creei,

ben sei eu o que é.

O que vive na miña cabeza,

nace e crece cando a min me peta,

porque non existe outro xeito de explicar esta vida,

este mundo de mentiras,

e, necesito algunha peza máis,

que una as pezas da mentira ,

que me deron no nacer,

que regaláronme tódolos días para,

así, facerme desaparecer.

E agora, eu soamente uno,

Peza a peza, 

mentira a mentira,

e creo novas pezas da mentira, 

para facer que as primeiras pezas coincidan,

formando metáforas que tranquilicen a miña cabeza ferida.

 

***

iria bragado de jesús

vigo, 1985

 

*


lido em: http://filo-cafes.blogspot.com/

publicado por carlossilva às 15:25
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Terça-feira, 12 de Abril de 2011
poema de amor informático

 

 
Hoy siento hambre de palabras nuevas,
sosegadas y menudas, con acentos
que penetren tan adentro en el pecho
que hasta el corazón se salga fuera.
Hoy me siento ávido de bytes y ternuras cálidas,
de torrentes coronados de caricias
que me escarben hondo el hueso
y liberen todo el RDSI del sentimiento.
 

 

 
Hay tanta tristeza archivada en mi memoria,
tantos megas de penas ocupando
el disco duro de mis pensamientos
que cada dedo tuyo sería una delete
certera en mitad de mi sistema operativo.
Hay tanto hacker de amor pirata
surcando mis venas que no acierto
con el run definitivo que te instale
para siempre en mi hardware.
 

 

 
Hoy quisiera destapar el modem de tu cuerpo
y por una vez acariciar tus pechos
en formato carne y no .gif, .jpg o .cdr,
responder a tus e-mails con la risa de mis labios
y añadir tu piel sin zip al site de mis favoritos.
Pero el KlezW32 de la distancia
impide ese setup que necesito
para arrancar del tuétano la tristeza
y completar el easy cleaner
de todos mis archivos obsoletos.
 
***
 

fernando luis pérez poza

pontevedra, 1958

 

*



lido em: http://filo-cafes.blogspot.com/

publicado por carlossilva às 12:28
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